quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Encontrando autoconfiança como mulher na ciência

Por Deborah Apgaua

Recebi nesse ano de 2016 um prêmio internacional que mudou a minha vida e visão sobre muitos aspectos da ciência. Este prêmio destina-se a mulheres de países em desenvolvimento, para que realizem pesquisa nas áreas de ciências, tecnologia, engenharia e matemática, em universidades e instituições com excelência internacional. Objetiva, portanto, formar uma rede transformadora da sociedade onde homens e mulheres possuam oportunidades semelhantes no mercado de trabalho.

Ilustração: Caia Colla
Ser mulher na ciência ainda é um desafio, especialmente em um país onde a maior parte dos professores universitários das áreas de exatas são homens, e existe um desequilíbrio de gênero em cargos relacionados a lideranças. Conforme o texto já publicado neste blog (o sexo realmente importa?), aceitar que esta diferença existe, o que ainda não acontece, pode ajudar a reverter este cenário. Ainda mais importante, o aumento da autoconfiança das mulheres ajudaria a quebrar esta barreira para a maior participação feminina.

É claro que a possibilidade de realizar uma pesquisa de pós-doutorado no exterior é uma parte importante da satisfação que sinto após a conquista deste prêmio. Porém, estar inserida em um grupo que busca uma nova direção para a ciência no mundo (esta “comunidade” tem o nome de “Faculty for the Future” e abre para novas propostas todos os anos, neste site), aumentou a minha autoconfiança para desenvolver pesquisa e me tornar um exemplo que inspire outras mulheres a seguir caminho semelhante. Portanto, muito antes de começar de fato minha pesquisa, tenho sentido uma grande diferença na forma com que exponho minhas ideias e guio estudantes em seus trabalhos.

Quando decidi tentar este programa, precisei relembrar e organizar toda a minha carreira acadêmica desde a graduação até o doutorado. Tive que buscar o valor de cada experiência e relacionar como isto pode me levar a um lugar que inspire outras mulheres. Então descobri uma nova força que estava dentro de mim, algo que não conhecia. Antes de submeter a proposta de trabalho fiz uma releitura e me senti realizada, independente do resultado da aplicação. Eu me pergunto quantas mulheres poderiam sentir esta satisfação se relembrassem cada passo de sua caminhada e colocassem valor em seu trabalho.

Por exemplo, percebi que eu possuo mais prática em ensinar do que havia me dado conta. Durante a minha graduação, desenvolvi trabalhos em comunidades tradicionais onde participei da devolução de resultados da pesquisa e ministração de minicursos. Além disso, durante a minha pós-graduação adquiri experiência através de estágios em docência, mesmo que assistida por meu orientador. Quando estive no exterior fazendo parte de meu doutorado, mantive contato com meus colegas de trabalho e auxiliei na correção de textos. Consegui, portanto, ver a relevância de todos estes momentos quando precisei convencer a Schlumberger foundation, criadora deste programa, que eu era uma candidata que merecia a premiação.

Para acreditar nesta realidade sem me diminuir, e sim encontrar merecimento em minhas escolhas acadêmicas, não me preocupei com o que eu poderia ter feito e não fiz. Quando fui submetida a uma entrevista em inglês que buscou confirmar o que eu tinha escrito, não me apresentei de forma séria e durona tentando demonstrar um estereótipo masculinizado para expressar poder. Ao contrário, fui simpática e feminina e encontrei confiança sendo eu mesma.

Ao receber o resultado positivo de minha proposta, a menina insegura que não consegue expressar suas ideias científicas por não acreditar que elas sejam relevantes, já não existia mais. Como concordo com a filosofia proposta pelo programa Faculty for the Future, resolvi encarar a missão de engajar e encorajar mais mulheres na ciência.  Decidi incorporar a mulher forte que estava adormecida dentro de mim e me ver como uma cientista que busca cada vez mais vivências e que sabe que ainda tem muito a aprender.

A partir deste momento, com a autoconfiança revitalizada, converso com mulheres na minha universidade e em outras instituições e vejo o semblante se modificando à medida que aponto a possibilidade de um caminho simples para suas conquistas. A mudança está dentro de nós, porque muitas vezes nos boicotamos pela insegurança e baixa estima. Foco e autoconfiança são as palavras chave para nossa transformação.

Em conversas com alunas da pós-graduação, percebi que algumas mulheres possuem medo de se tornar apenas uma “sombra” de outros homens (talvez resultado de um ambiente de trabalho predominantemente masculino, onde de 31 professores apenas 3 são mulheres). Porém, o medo paralisa, e age no sentido contrário de ações que podem nos libertar da subordinação. Assim, quando superamos a insegurança e o medo de nos tornarmos menores que homens na ciência, nos autoafirmamos para agirmos no caminho do conhecimento que levará ao sucesso acadêmico.

O resultado dessas mudanças também é facilitado quando compreendemos que não fazemos ciência sozinhas e a colaboração é essencial. Assim, podemos transformar competição em colaboração e aceitar com mais facilidade que em nenhum passo acadêmico devemos estar sozinhas, pois precisamos lapidar o nosso trabalho. Sejam homens ou mulheres, acreditar que a ciência avança com colaboração diminui nosso ego e o peso da responsabilidade de deter um conhecimento que está constantemente sendo construído.

Links relevantes:

Sobre Deborah:


Sou doutora ecóloga florestal, apaixonada pelas florestas tropicais do mundo. Graduei-me em biologia e nesta fase busquei abordagens etnobiológicas. Já no meu mestrado e doutorado, trabalhei com ecologia florestal para estar em contato direto com as florestas brasileiras, mas no meu doutorado acabei indo parar na Austrália onde desenvolvi meu projeto com características funcionais das plantas de floresta úmida. Atualmente estou me preparando para voltar à Austrália e realizar pós-doutorado com o apoio de um prêmio que recebi para mulheres na ciência. Pretendo compreender as características de plantas que serão mais favoráveis em cenários de secas extremas causadas por mudança climática e trazer o conhecimento para o Brasil. Espero inspirar outras mulheres a seguir carreira acadêmica.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Quem estuda o feio, bonito lhe parece

Por Jana M. del Favero
Ilustração Joana Ho.
Você sabe o que o golfinho-rotador, a tartaruga marinha e o urso panda têm em comum? Todos são considerados espécies-bandeira, ou seja, espécies carismáticas que conseguem chamar a atenção do público para uma causa conservacionista. Esse conceito surgiu na década de 80, pois como não era possível financiar projetos de proteção para todas as espécies de uma área, ao elevar o status de uma espécie carismática era possível assegurar a conservação da biodiversidade em geral. Lembro-me que quando estagiei no Projeto Tamar ao receber turistas na base de Ubatuba e falar sobre as tartarugas marinhas, eu acabava falando também sobre os peixes que elas consumiam, os danos que o lixo e o uso do carro em áreas de desova causavam e assim ia passando várias outras mensagens junto com o recado principal... Ou seja, ao falar da importância de se preservar a espécie-bandeira em questão, falava também da importância de se preservar todo o ecossistema.

Embora seja um conceito eficiente (quem não pensa no mico-leão-dourado ao lembrar da preservação da Mata Atlântica?), é preciso cautela ao aplicá-lo. Ao priorizar as espécies-bandeiras, corre-se o risco de não preservar quem mais precisa, quem está mais em risco de extinção. E diversas são as espécies ameaçadas de extinção. Alguns cientistas até defendem que estamos passando pela sexta grande extinção da Terra (episódios no qual grandes números de espécies foram extintas em um curto período de tempo). Veja na figura abaixo quais foram as grandes extinções e suas causas.


Conforme mostrado na figura acima, todas as extinções em massa foram causadas por catástrofes naturais, como a queda de um meteorito. Agora pasmem, a sexta extinção está sendo causada por NÓS! Paradoxalmente, os causadores da sexta extinção são também os que podem evitar que ela seja mais trágica.

Pois bem, foi pensando em proteger um grupo de animais ameaçados de extinção e “desfavorecidos” que o biólogo Simon Watt criou a “Sociedade de Preservação dos Animais Feios” (Ugly Animal Preservation Society). Sim, eu não escrevi errado, a ideia desse biólogo foi justamente contrária ao uso das tradicionais espécies-bandeira. Segundo o criador, não é justo que o panda fique com toda a atenção.

A ideia inovadora do Simon Watt não parou ao criar a sociedade e divulgar espécies feias e ameaçadas. Para levantar fundos e salvar as espécies esteticamente não privilegiadas, ele e um grupo de artistas se aventuraram pelo Reino Unido apresentando noites teatrais, como um stand up comedy, no qual cada artista apresentava um animal feio e no fim de cada noite as pessoas podiam votar qual seria o mascote da sociedade.

E no meio do mais esquisito sapo, salamandra, lesma ou inseto, o grande mascote vencedor foi um peixe marinho, o blobfish ou peixe-bolha ou peixe-gota. Este peixe, cientificamente chamado de Psychrolutes marcidus, além de ser feio, habita as águas profundas (entre 600 e 1200 metros de profundidade) do sul da Austrália, incluindo a Tasmânia. Eles não possuem bexiga natatória, têm o mínimo de ossos necessário, e o corpo com consistência gelatinosa, conseguindo, deste modo, combater a alta pressão do ambiente em que vivem ao terem a água ao seu redor como seu principal mecanismo estrutural.

Mas confesso que achei a votação um tanto injusta, pois sabendo que a cada 10 metros que mergulhássemos para encontrar o blobfish a pressão aumentaria 1 atm, encontraríamos a feia criatura em um ambiente com mais de 60 atm e provavelmente nossos órgãos se esmagariam e nós pareceríamos uma pasta (na verdade já íamos ter morrido bem antes!), enquanto o blobfish estaria parecendo um peixe “comum” e não aquela criatura gelatinosa que julgamos tão feia ao analisá-la na superfície terrestre, em apenas 1 atm.


Capa do livro escrito por Simom Watt com uma imagem do mascote da “Sociedade de Preservação dos Animais Feios”, o blobfish.

Outro peixe marinho que concorria como o animal mais feio era a enguia europeia (nome científico: Anguilla anguilla). Apesar de criticamente ameaçada e de parecer mais uma cobra do que um peixe, acredito que essa espécie nem devia estar nesta competição. A enguia europeia é uma espécie de peixe eurialino, que aguenta grande variação de salinidade, e catadrómico, que cresce em rios e desovam do mar. Além do mais, possui larvas do tipo leptocéfalas, que são lindas, duram cerca de 3 anos e chegam a atingir 8 cm de comprimento.


Enguia adulta (esquerda) e em fase larval (direita).

E agora, consegui convencer que a enguia europeia e o blobfish não são feios, mas que sim, precisam da nossa atenção e proteção?!

E para você, qual animal ameaçado de extinção é feio de dar dó e deveria ser preservado?

Saiba mais:


Sobre a Ugly Animal Preservation Society (entre e ria muito vendo os vídeos):

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Osmose e Osmorregulação

Por Gabrielle Souza


Os seres vivos marinhos mais simples que conhecemos vivem em equilíbrio com o meio hídrico onde estão inseridos. Porém, de modo geral, quanto maior a complexidade do organismo, mas sua constituição interior difere do meio ambiente onde vive e por isso é preciso adaptar-se fisiologicamente, utilizando um processo natural denominado de osmorregulação. 

Antes de falarmos de osmorregulação é importante definir o que é osmose! Osmose é simplesmente o movimento da água através de uma membrana permeável, regido pela diferença de concentração entre solutos. Ou seja, a água sempre tende a atravessar uma membrana permeável do local menos concentrado (hipotônico) em direção ao local com maior concentração de solutos (hipertônico). E isso acontece naturalmente, sem gasto de energia. Agora sim, sabendo do que se trata a osmose, podemos te dizer que a osmorregulação é o nome que damos à capacidade de um organismo de regular a quantidade de água e/ou solutos em seu interior, independente do que aconteceria se apenas a osmose estivesse acontecendo. Essa é uma estratégia amplamente utilizada por organismos marinhos para regular os sais e a água em seus corpos, mantendo-se diferentes do meio externo.


Existem diversos animais que realizam este processo, são alguns exemplos: peixes, baleias, golfinhos, moluscos, crustáceos, entre outros. Na imagem abaixo pode-se analisar como a osmorregulação é feita por peixes de água salgada, mas lembre-se que há uma diferença com os peixes de água doce. Afinal de contas, a quantidade de sais na água do mar é bem diferente da água doce.


Existem mais sais na água do mar do que dentro do corpo dos peixes marinhos, por isso haverá uma perda de água constante para o meio, pela osmose, o que levaria a uma rápida desidratação. Porém, os peixes marinhos têm o comportamento de ingerir a água do mar, repondo essa perda de água. Mas... e os sais ingeridos junto com essa água salgada? Eles devem eliminar este excesso de sais no corpo. E como isto é feito? Esse é um trabalho para as brânquias! Isso mesmo. Além das trocas gasosas, as brânquias são também responsáveis por eliminar o excesso de sais no corpo do peixe. 
Já nos peixes de água doce a situação é inversa. O meio é menos concentrado e o interior do peixe é mais concentrado. Neste caso a água entra por osmose no corpo do peixe, através da sua superfície. Estes peixes não ingerem água e suas brânquias, por sua vez, acabam absorvendo os sais. Não é incrível?

Post relacionados:
Querida, estou grávido

Para saber mais:

Schmidt Nielsen, Knut. Fisiologia Animal - Adaptação e Meio Ambiente. Quinta Edição, Livraria Santos Editora, São Paulo. 2002, 600 p.

Eckert, R; Randall, D; Burggren. W. Fisiologia Animal. Mecanismos e Adaptações. Guanabara ed. 4ª. Edição. 2011. 729p

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

"A divulgação científica tem o papel fundamental de explicitar o que está acontecendo no nosso mundo"

Entrevista com Mariluce Moura por Raquel Saraiva

Ilustração de Caia Colla
Resultados de pesquisas científicas de grande interesse do público eventualmente transbordam dos veículos especializados e alcançam veículos de grande circulação. Com a epidemia do zika,  a demanda por dados que explicassem os efeitos do vírus eram urgentes. Nesse contexto, um estudo desenvolvido por pesquisadores da UFRJ e do Instituto D’Or demonstrou os efeitos devastadores do vírus sobre células neurais.  Os resultados do trabalho seguiram o caminho contrário da conduta científica usual e foram divulgados na Folha de SP no artigo “Em testes, vírus da zika ataca neurônios humanos antes da publicação em uma revista científica. Embora a OMS recomende em casos de emergência a divulgação dos dados mesmo antes da publicação da pesquisa em periódico especializado, a “novidade” gerou estranheza e críticas na comunidade científica.
Esse e outros temas tem trazido a ciência brasileira para os holofotes da imprensa. Não só pelos resultados, avanços e inovações, mas por polêmicas que envolvem o próprio fazer científico. Recentemente, após declaração nefasta do governador Geraldo Alckmin, discutimos aqui no blog a importância da ciência básica, e a destruição do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação no post “Ciência nada básica”. Além destas discussões vigentes, outras questões nunca saem da pauta; elas requerem - e tem tido - nossa atenção. Por exemplo, a atuação das mulheres na ciência! Na seção Mulheres na Ciência sempre discutimos questões que estão envolvidas no plano pessoal e profissional da atuação das mulheres no meio acadêmico, desde maternidade (leia O filho que concorreu com a ciência e empatou), a influência do gênero na carreira (O sexo realmente importa?), até estupro (Tragédias também ocorrem no paraíso).
Biólogos e oceanógrafos sempre discutem estes e outros temas aqui no blog. Desta vez, convidamos uma jornalista científica para uma entrevista. Profunda conhecedora (de prática e de teoria) da divulgação científica, a profa. Dra. Mariluce Moura, cuja trajetória no ramo se confunde com a própria história da divulgação científica no Brasil nas últimas décadas. Mariluce foi presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico, é pesquisadora colaboradora do LabJor (Unicamp), centro de referência da América Latina para estudos e formação de profissionais em divulgação científica, trabalhou como assessora de imprensa e coordenadora de comunicação do CNPq e foi assessora e diretora científica da Fapesp. A jornalista, graduada pela UFBA, também foi a mentora e dirigiu, no período de 1995 a 2014, a mais prestigiada revista científica brasileira, a Pesquisa Fapesp. Atualmente Mariluce é professora da Faculdade de Comunicação da UFBA e coordenadora do projeto Ciência na Rua (ciencianarua.net), blog voltado para a divulgação científica para jovens de 14 a 25 anos.

Com a Palavra, Mariluce!

Bate-papo com Netuno: Qual a importância da divulgação científica para a sociedade brasileira?

Mariluce Moura: É vital! A ciência e a tecnologia são dois dos pilares da estruturação econômica da sociedade. Aliás, não só econômica. A sociedade contemporânea é estruturada sobre o conhecimento científico. Algumas reflexões filosóficas dizem que hoje, se a gente pensar por exemplo no Ciclo Mutações que vai acontecer na UFBA de 03/10 a 25/11, o mundo hoje é um mundo em mutação. O rumo das coisas tem sido muito mais determinado, para bem e para o mal, pelos fatos científicos do que pelas reflexões, pela atividade do pensamento, pelo refletir profundamente sobre para onde vamos e como caminhamos. Assim como os fatos científicos, as descobertas científicas e as tecnologias, as inovações constituem de modo tão entranhado o nosso cotidiano. É fundamental que a sociedade tenha percepção sobre esse fenômeno, e que se dê conta disso, que perceba aquilo que altera o seu próprio cotidiano, sua própria vida. Pense em todas as mudanças das duas últimas décadas: no âmbito digital, da biotecnologia, das novas tecnologias de saúde. A própria troca social entre as pessoas se dá de maneira muito mais diversa que há duas décadas: hoje nós nos falamos menos por voz e muito mais pelo Whatsapp e pelas redes sociais. A divulgação científica tem o papel fundamental de explicitar o que está acontecendo no nosso mundo hoje, aqui e agora.

BPCN: Como a senhora vê o jornalismo científico hoje em dia no Brasil?

MM: Existem poucos jornalistas de ciência, mas grandes profissionais, como a Sabine Righetti, o Reinaldo José Lopes, o Salvador Nogueira, o Marcelo Leite e o Ricardo Zorzetto.  Há pouco espaço na mídia tradicional para a ciência. Falta espaço em muitos veículos, mas há belas frentes se abrindo, inclusive se alimentada por profissionais de outros campos, como a biologia. Acho que o espaço da internet tende a apresentar um panorama. Infelizmente, ainda não é um campo com o peso que deveria ter na sociedade contemporânea.

BPCN: Qual a importância dos blogs para a popularização da ciência?

MM: É um veículo muito interessante, para ampliar a divulgação e a popularização da ciência. Penso que os blogs escritos pelos próprios cientistas nem sempre estão muito antenados com o interesse geral da população, mas eu acho que eles trazem uma grande contribuição à disseminação de informação. Acho muito positivo o surgimento dos blogs de ciência.

BPCN: A senhora acha que as mulheres fazem diferença na divulgação científica?

MM: Sempre faz bem às diversas atividades culturais e científicas que a sociedade esteja bem expressada naquele campo. Se uma determinada área tem muito mais homens brancos, por exemplo, a sociedade como um todo está mal expressada. A esse propósito, não só da divulgação científica mas da própria ciência, nesta semana saiu uma matéria na Nature falando que, em síntese, teríamos melhor ciência se os países pobres também produzissem ciência. É um artigo na mais badalada revista de ciência do mundo! É uma consciência que tem aumentado, sobre a necessidade de se ter nas atividades fundamentais de ampliação do conhecimento, por exemplo, representantes dos muitos segmentos de gênero, étnicos, dentre outros. É preciso  que as mulheres estejam muito mais presentes não só nesta, mas em todas as atividades como as de produção cultural, de arte e de conhecimento.

BPCN: Recentemente, a divulgação de resultados de pesquisas na imprensa antes da publicação do trabalho em uma revista científica criou uma polêmica e gerou debates na comunidade científica. O que a senhora pensa sobre a divulgação de resultados antes da publicação em revistas científicas?

MM: Em linhas gerais, para o divulgador de ciência, sobretudo para o jornalista de ciência, é bastante interessante que o artigo tenha saído em uma revista científica. Porque sair na revista significa que houve validação pelos pares. Isso dá uma garantia, que não é absoluta porque sabemos da ocorrência de fraudes mesmo em artigos publicados por revistas altamente respeitadas, mas é uma garantia adicional para o jornalista. Mas existem situações de emergência, que é o caso do zika vírus, por exemplo. Havia todo um esforço pelo isolamento do vírus, para entender o que estava causando aquele problema aqui no Brasil, então existem alguns momentos nos quais há uma certa emergência no âmbito da produção científica e no âmbito da divulgação para a sociedade. Com os cuidados naturais de checagem com outras fontes e com outros cientistas que a gente respeite, que são da mesma área e que inclusive possam levantar contraditórios sobre aquilo que está sendo divulgado, eu acho que é o caso de se utilizar sim na divulgação científica. Uma matéria, uma reportagem ou uma notícia deve ter uma informação. E se existe um contraditório possível dessa informação, é bom que o jornalista mostre também esse outro lado. Em ciência isso nem sempre se dá assim. Mas é bom que se respeite esse princípio geral do jornalismo. Então, tomados os cuidados necessários, é possível às vezes sair da regra de ouro de esperar a revista científica publicar sem que se faça uma coisa leviana.



Sugestões de leitura:

Desafios antigos para mulheres atuais - Jana del Favero (Bate-papo com Netuno)